“Marido tendo um caso?"
"Não. Não sou casada."
"Pessoa desaparecida?"
"Não."
"Animal desaparecido?"
"…"
ela não sorri. os músculos de seu rosto nem mesmo se contraem. ao menos não notei. não sei porque, mas me ocorreu a imagem de um navio quebra-gelo.
tudo cheirando ao bom e velho clichê cinematográfico. dos que acabam mal.
"Bem, srta. Omen…"
"Só Amélia, por favor."
"Certo. Amélia. Você mataria uma curiosidade minha? Só pra ver se consigo melhorar o atendimento. Como descobriu minha agência?"
"Na lista telefônica."
devia ter feito a outra pergunta… sobre como ela consegue respirar com a roupa tão apertada. perdi a oportunidade.
"Claro. Ninguém indicou, então?"
"Não. Falei com o senhor por telefone ontem, lembra-se?"
lembro. tarde demais outra vez. poderia dar uma melhor impressão se minha memória não tivesse sido tão afetada pelo consumo excessivo de… substâncias. lícitas, claro.
atender um cliente por telefone… consiste em deixar minha imaginação repassar episódios das séries policiais de que gosto até o momento que o cliente potencial diz algo interessante, como "posso marcar uma hora?".
séculos de orçamentos que não resultam em serviço me condicionaram.
e foi o que ela disse.
vender meus serviços é uma arte. arte para a qual, admito, não tenho muito talento. não tenho a paciência necessária pro ritual da corte.
a experiência diz que não devemos dar o preço pelo telefone. é necessário alimentar as dúvidas do cliente, devastá-lo, fazer com que chegue ‘a entrevista de joelhos, implorando, nos considerando amigos de infância, e então, só então, damos o preço.
aí já é tarde demais. para eles, claro (bom, ao menos é o que diz o manual).
depois de marcarmos pra hoje, falhei e disse o preço. ignorei o manual. ela veio pelo preço. meu nome não é o primeiro na lista e tem agências melhores que a minha. que seja. vamos aos negócios.
"Então, Amélia, o que posso fazer por você?
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